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terça-feira, 23 de setembro de 2014

A Força Da Caridade

Antes que o sol se escondesse no horizonte, Jesus costumeiramente acercava-se do lago Tiberíades para sua pregação vespertina. Numa dessas tardes em que o Mestre, utilizando sua luminescência verbal, conclamava o povo para o devido desprendimento, argumentando ser a renúncia importante estrada de acesso à verdadeira felicidade, uma jovem mulher, ousando interromper a exposição do Messias, dirigi-lhe a palavra:
–Mestre! Meu esposo sempre representou para mim a verdadeira felicidade. Porém, há algum tempo desapareceu sem que   ninguém pudesse informar-me sobre seu paradeiro. Estou vivendo ansiosa espera sem, contudo receber quaisquer notícias de meu estimado companheiro, pergunto-lhe, como poderia eu utilizar essa  renúncia a ponto de consegui-lo de volta? Sei que para o Senhor, problemas aparentemente insolúveis tem encontrado uma saída, entretanto, meu caso tem se revelado difícil e por isso de    amargurada desesperança...
Jesus, depois de observar a mulher demoradamente, ergue o olhar magnânimo em direção ao suave marulhar do lago como se estivesse vivendo profunda reflexão afirmou:
–Ainda hoje pela manhã um menino bateu à sua porta implorando alimentação tanto para ele quanto para a sua família. Trazia no semblante triste as marcas de acentuado sofrimento. 
–Sim! Tratava-se de um garoto bastante franzino!- exclama com surpresa a mulher. No momento em que ele esmolava confesso que me encontrava por demais revoltada com a situação.
–Você ofereceu-lhe um pão?
–Não, mestre, nada lhe dei! Na verdade o despachei sem mesmo ouvir o que ele tentava me dizer.
–Da próxima vez, dê-lhe pão - recomenda Jesus.
–Com isso terei meu marido de volta?
–Sim!- responde simplesmente o Mestre.
A mulher se foi toda esperançosa e Jesus prosseguiu em sua pregação. Pedro e Filipe entreolharam-se preocupados receosos de que a sofrida criatura não lograsse alcançar o êxito esperado. Notaram que os mais entusiasmados iniciavam pequenas rodas de apostas, esperando auferir lucros com o desfecho do caso. Com isso a notícia espalhando-se por toda Cafarnaum suscitara a curiosidade da população que voltara sua atenção para a rumorosa novidade.
As autoridades religiosas, incomodadas com o crescimento do número de seguidores do Nazareno, enviaram espiões na tentativa de que fosse colhido um possível insucesso de Jesus. Até então, tais tentativas resultaram em repetidos fracassos, pois, os encarregados das sórdidas empreitadas, longe de levarem qualquer testemunho negativo em relação aos feitos do Mestre, deslumbrados diante das suas maravilhas, acabaram convertendo-se à Nova Doutrina. 
Na tarde do dia seguinte, quando Jeusus iniciava suas carinhosas palavras, surge novamente a mulher que diante de todos, após erguer os dois braços exclamou lacrimosa:
–Mestre! Desta vez dei um pão ao menino.
A população contendo a respiração aguardava impassível revezando o olhar entre a figura sublime do Messias e da mulher cujo esposo havia misteriosamente desaparecido. Para uma grande parte dos apostadores a quantia colocada em jogo representava a raspa de todos os recursos, principalmente no que diz respeito aos mais simples que confiantes na palavra do Senhor, apostaram suas moedas.  
Relanceando o olhar pela multidão, Jesus assim que se voltou para a mulher perguntou:
–E seu marido, voltou?
–Não! Afirma a mulher em soluços.
Por alguns segundos a multidão permaneceu em sepulcral silêncio, para em seguida promover um ensurdecedor vozerio. Os emissários do império e do poder religioso riam à larga. Finalmente o curandeiro seria desmascarado a ordem voltaria. Mas para surpresa de todos Jesus disse: 
–Então volte e amanhã, ao invés de um, dê-lhe dois pães.
Lá se foi a mulher sem muitas esperanças e o povo, que começava também a ficar impaciente, chegava mesmo a renovar as apostas. Os mais exaltados das duas facções chegavam as lutas físicas gerando um clima de guerra entre os assistentes.
No dia seguinte o fato se repete.
–Mestre! O menino bateu novamente à minha porta e dei-lhe dois pães, como o senhor havia recomendado.
–E seu marido voltou?
–Não! – responde a mulher em desespero.
A resposta caiu como a explosão de um trovão em torno do lago. Até mesmo os discípulos que haviam presenciado os feitos incríveis, como cegos retomando a visão, leprosos sendo limpos, agora já não guardavam tanta certeza quanto as possibilidades do Messias. Com isso os maldizentes se aproveitavam promovendo algazarra. Mas assim que Jesus ergueu a destra a multidão fez  silêncio para ouvi-lo dizer:
–Então retorne e ofereça-lhe três pães por três dias consecutivos.
Aumentou o número de apostas e a plateia tornava-se cada vez mais impaciente. Por três dias as pregações transcorreram dentro de um clima de perfeita normalidade, mas no quarto dia, cerca de duas horas antes da pregação, as margens do Tiberíades recebiam uma verdadeira multidão que se acotovelava ansiosa para saber o desfecho do caso da estranha mulher. E, no horário aprazado, aproxima-se a mulher novamente.

–Mestre, o menino visitou minha casa por três dias consecutivos e seguindo sua orientação ofereci-lhe todos os pães recomendados.
Fez-se o silêncio. Até os discípulos revelavam nos olhos espantados extrema preocupação. O mestre, mais uma vez, observou longamente a mulher e fez a clássica pergunta:
–E seu marido voltou?
–Voltou mestre, voltou!
Houve uma gritaria geral. O povo pulava sobre as águas do lago e quando o silêncio se fez, a mulher dirigiu-se respeitosa a Jesus.
–Mestre, gostaria de saber qual a relação entre oferecer pães a um garoto e meu marido voltar?
–Seu esposo não contou? – Indaga Jesus.
–Ele somente me informou que todas as tardes um menino franzino olhava para dentro do poço onde ele havia caído, até que um dia apareceu um rapaz mais forte, estendeu-lhe uma vara, retirando-o do buraco.
–Mulher! Esclareceu Jesus – o menino sempre foi o mesmo, mas no primeiro dia o pão que você lhe ofertou, ele atirou ao poço para que seu esposo pudesse alimentar-se; no segundo dia, ele atirou um pão e ficou com outro para si; no terceiro dia ele atirou um e comeu dois. Fortaleceu-se e retirou o seu marido do poço.
A estranha mulher despediu-se agradecida e a multidão quedou-se a meditar.

Psicografia de Alvaro Basile Portughesi.

Pelo Espírito Euzébio.

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